sábado, junho 23, 2012

O CONCEITO DE DEUS EM KIERKEGAARD




O importante é entender –me a mim mesmo, é perceber o que Deus realmente quer que eu faça; o importante é achar uma verdade que é verdadeira para mim, achar a idéia em prol da qual posso viver e morrer” Journals p.44. In Filosofia e Fé Cristã, Colin Brown 

Em 1848, Kierkegaard passou pela experiência de conversão e registrou em um de seus Jounals o seguinte testemunho: “A totalidade do meu ser está transformada... Mas a crença no perdão dos pecados significa crer que aqui no tempo o pecado é esquecido por Deus, que é realmente verdade que Deus o esquece.” Kierkegaard se opunha a Hegel e ridiculariza os argumentos abstratos da metafísica especulativa. Ele escreve sobre Hegel em 1850: 

“Quantas vezes demonstrei que fundamentalmente Hegel torna os homens em pagãos, em raça de animais com o dom do raciocínio. No mundo animal, pois, "indivíduo” sempre é menos importante do que raça. Mas a peculiaridade da raça humana é: justamente porque o indivíduo é criado à imagem de Deus, o “indivíduo” está acima da raça. Isto pode ser entendido erroneamente e terrivelmente abusado, reconheço. Mas isso é o cristianismo. E é aí que a batalha deve ser travada.” Journals. 

Para Kierkegaard a subjetividade isolada é má, assim como a objetividade de Hegel por si só, também é má. Para ele, a única salvação era a subjetividade. Deus era como uma subjetividade infinita e compulsora. Por se tratar o cristianismo de uma religião histórica e em decorrência das críticas desta realidade, Kierkegaard escreveu que os resultados dos fatos históricos para ele eram incertos, o importante era a escolha subjetiva. Crer em Deus era um salto de fé, um comprometimento com o absurdo. A pessoa faz uma escolha por aquele fato histórico porque este significa tanto para ela que até arrisca a vida por ele. “ Então vive; vive inteiramente cheio da idéia, e arrisca sua vida por ela; e sua vida é a prova de que crê”. Não precisa haver provas para a pessoa crer e viver esta fé. A fé é impossível se houver provas e certezas. Sem riscos não há fé, é uma impossibilidade. A fé e a razão são opostas mutuamente exclusivas. 

O autor Colin Browm compara o conceito de Deus de Kierkegaard comum à estória do Mágico de Oz, ou seja, não é tanto a sua existência o que importa, mas o pensamento sobre sua existência. Nesta estória, o homem de palha, o homem de latão e o leão covarde mudam o curso de suas vidas porque crêem no Mágico de Oz. Porém, no final, este mágico é na verdade um homem comum. Do mesmo modo para Kierkegaard, o pensamento a respeito de Deus o impulsionava para reagir, de certa forma, mais do que o encontro com o próprio Deus.

Surge no conceito de Deus no pensamento de Kierkegaard, uma palavra chave: o amor. É por amor que Deus deve decidir-se eternamente a agir, mas como seu amor é a causa, seu amor deve também ser o fim. Deus quer restabelecer a igualdade entre Si e o homem (discípulo), assim com um rei que se apaixona por uma plebéia. Tal idéia per si é incongruente, mas o rei é o rei, acima de tudo. Segundo Kierkegaard, “Deus encontra sua alegria em vestir ao lírio com mais esplendor que Salomão” (Fragmentos Filosóficos, p. 59). O amor de Deus não somente ensina, mas também leva a um novo nascimento do discípulo, passando do não ser ao ser, pois “o fazer nascer pertence a Deus cujo amor é regenerador” (Fragmentos, p. 68). 

Deus busca a unidade, de Si com o não ser do homem. Assim, “para obter a unidade, Deus deve se fazer igual ao seu discípulo”, e para isto toma a forma de servo. Deus sofre a fome, o deserto, tudo experimenta por amor ao discípulo. Kierkegaard afirma que só Deus pode salvar o indivíduo do desespero: “Deus pode a todo instante...” (Chaves, Odilon. Sofrimento e Fé em Kierkegaard, 1978. p. 36). Não seria também por isso que ele afirma que se deve “tremer” diante de Deus? “É impossível enganar a Deus, Ele é o onisciente, o onipotente” (Attack Upon Christendom, p. 255). E ainda, “Ele é o único que tem uma verdadeira concepção do infinito que Ele é” (Attack Upon Christendom, p. 255). 

Por outro lado, Kierkegaard menciona ser fácil o enganar a Deus. Não que Deus não notaria a “presença” do homem tentando agradá-lo. Deus, na verdade, cria uma situação na qual o homem, se ele quiser, pode “enganar” a Deus. Como isto é possível? Deus permite que o homem sofra para que ele perceba que é um abandonado de Deus, e que tenta enganá-lo, e, se Deus, na opinião do homem não está atento para este fato, o homem enganou a Deus (Attack Upon Christendom, p.256). Por isso diz Kierkegaard: “Tremei!”

No tocante à justiça de Deus, Kierkegaard diz que cada criminoso, cada pecador, que pode ser punido neste mundo, pode também ser salvo para a eternidade. Na eternidade, o que será lembrado? O sofrer, aqui, pela verdade. Todas as transações neste mundo têm como filtro o intelectualismo e a espiritualidade, sendo Deus nos Céus o parceiro. 


http://existencialismo.sites.uol.com.br/kierkegaard.htm





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